domingo, 30 de março de 2014

O PT E A REVOLUÇÃO DOS BICHOS



Embora prestes a ser sancionada, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Petrobrás nem foi confirmada e a sua relação com o clássico A Revolução dos Bichos, do jornalista e escritor britânico George Orwell (1903-1950) nunca foi tão atual. Considerado um dos calos do regime militar e dos partidos de direita, como no governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-2003), o Partido dos Trabalhadores (quem diria?) tenta a todo custo evitar (fato que mais fomentou) a implantação da CPI sobre a aquisição da refinaria americana Pasadena, pela Petrobrás desde 2006. Seria, como diz o adágio popular, o feitiço contra o feiticeiro?

Mas o que a principal obra de Orwell tem a ver com tudo isso? Publicado em 1945, no final da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), A Revolução dos Bichos havia penado pelo apoio de uma editora, visto que, apesar de pertencer ao gênero das fábulas literárias, ela representava uma ameaça à Rússia comunista, então aliada do ocidente contra o nazifacismo

No conteúdo, o livro retrata a fazenda Granja Solar, cujo fazendeiro era muito cruel com os animais do celeiro. Cansados de tanta opressão, os bichos se organizam e, sob a liderança de três porcos, porco Bola, Neve e Napoleão, os mais inteligentes na visão do autor, realizam uma constituição própria com o objetivo de instituir um sistema cooperativo e igualitário, sob o slogan “Todos os bichos são iguais”.

Depois de expulsar o fazendeiro, um dos porcos rompe com a recente aliança firmada entre eles (como o PT x PSB de Pernambuco). E Napoleão, o porco vitorioso, além de modificar as leis, também assume uma postura política ainda pior que a do antigo fazendeiro. E a gota d’água foi modificar, inclusive, a última lei, agora inspirada no lema: “Todos os bichos são iguais, mas alguns bichos são mais iguais que outros”. Apesar de rejeitada inicialmente, a referida obra, inversamente, foi bastante explorada no auge da Guerra Fria. Na época, o mundo era dividido entre capitalistas e comunistas, liderados, respectivamente, pelos Estados Unidos e a antiga União Soviética, numa queda de braço jamais vista na história mundial.

Os paralelos com a recente trajetória política brasileira são impressionantes. No ano em que a história relembra os 50 anos do Golpe Militar de 1964 (o cruel fazendeiro), encerrado em 1985, o País testemunhou confuso, atônito (e decepcionado) os antigos “heróis” das diretas já! sentarem no banco dos réus, em seguida aprisionados, com direito a poses patéticas para os fotógrafos, no melhor que a esclerose dogmática marxista pode passar; a proliferação dos conceitos neoliberais, como a condenada privatização; empréstimos a fundo perdido, como no caso de Cuba; o retorno da tão temida inflação, juros astronômicos, encolhimento do Produto Interno Bruto - PIB, além de deixar a sociedade brasileira à beira de uma guerra civil.

Cansado de tanta injustiça e corrupção, o País inteiro ocupou as principais ruas e avenidas para protestar e exigir melhorias dos governantes. Tal manifestação não acontecia no Brasil desde o governo Collor (1990-1992), quando o povo exigiu o impeachment do então presidente da República.

Apesar da obra do escritor britânico ter sido associada ao regime soviético, ela tornou-se perfeitamente adaptável para avaliar, por afinidade de aspectos, qualquer governo do mundo atual. As ditaduras nunca foram a melhor saída política em função da supressão da liberdade. A democracia é uma conquista popular. Mas um governo que se diz democrático deve ser capaz de gerir a nação, e quando sua administração despertar em seu povo saudade com alguma qualidade das ditaduras, sinal vermelho à vista. Para que não retornemos ao passado, é indispensável renovação. E apenas o voto pode oxigenar o futuro. Brasileiros, avante! Porque a luta continua.


Nelson Sampaio Júnior é jornalista e membro da União Brasileira dos Escritores - UBE.

quinta-feira, 6 de março de 2014

Caso Mensalão: Decepção à Bolonhesa

                                                                   Recife, 06 de março de 2014

        Quadrilha Feliz: Os parlamentares Genoino (E) e José Dirceu comemoram decisão
                                 


Por Nelson Sampaio Junior


“Esta é uma tarde triste para o STF” declarou, em tom de frustração, o presidente do Supremo Tribunal Joaquim Barbosa. A frustrante declaração (compartilhada pela sociedade) refere-se a absolvição executada pelo Supremo ao entender como inexistente o óbvio e uluante crime de formação quadrilha dos parlamentares acusados. Por diferença de apenas um voto (6x5) a mais alta corte do país perdeu uma oportunidade histórica de passar a limpo a maior chaga da sociedade brasileira: a impunidade frente a corrupção.


Prestes a completar dois anos, o julgamento despertou por alguns momentos a esperança de virar esta página. Semelhante a um seriado americano (mas sem final feliz), o roteiro parecia perfeito, amplo espaço para a defesa dos réus, recursos, prazos, atrito de opiniões entre ambos os lados, episódio por episódio num espetáculo midiático jamais visto na história deste país.

E como fez Pilatos no julgamento de Cristo, até mesmo o governo petista parecia ter deixado os seus “filhos” à própria sorte, disponíveis à justiça. E os próprios réus, já condenados, e com aparições patéticas dos “heróis que morreram de overdose” já pareciam conformados com a ideia de contemplar o sol nascer quadrado. Lembrava mesmo a escatológica luta do bem contra o mal. Até o dia em que a corte sofreu baixa de dois ministros: o do ex-presidente Ayres Brito, além do ministro Cezar Peluso, aposentados por idade. Em substituição, entraram Luís Roberto 
Barroso e Teori Zavascki, que votaram em favor dos mensaleiros.

Embora esteja próximo de ser concluído, o andamento do julgamento nem chegou ao fim e sua ligação com o pensamento do filósofo marxista Michel Foucault (1926-1984) nunca foi tão atual. Completar 30 anos de sua morte Foucault (leia-se Fucô) ganhou destaque internacional por abordar em seus livros o conceito de prisão no mundo contemporâneo. Vigiar e Punir, e Microfísica do 

Poder certamente constituem suas obras mais importantes.
Na essência, como o “desnudar do rei” este filósofo francês concluiu que a justiça penal não passava de um mecanismo de dominação de classe, produzida pela elite política e econômica para a aplicação às classes desfavorecidas. Para isso, utilizavam-se da lei penal, o que ele chamou de instrumento de classe. Este, por sua vez atendia (e atende) aos objetivos ideológicos (repressão das classes inferiores) e os reais (imunização das elites). Combinados, eles representam a chamada gestão diferencial, apesar de pomposo, na prática, seu nome é sinônimo de impunidade.

Os paralelos do sofisticado esquema foucaultiano (leia-se fucôtiano) com o maior escândalo processual da história do Brasil são surpreendentes em sua atualidade. A começar pela corte escolhida: o Supremo Tribunal Federal – STF, destinada só para as elites; os juízes do caso, todos ministros e indicados pelo governo (quando o ideal seria por concurso); além da lei penal, contraditória e cheia de brechas de tolerância, a exemplo da imunidade parlamentar; além da perda de mandato dos condenados desconectada do poder judiciário; e o amplo e indeterminado prazo para defesa, porém com data certa para invalidação de sua pena. 

Em outras palavras, os parlamentares acusados, além de caríssimos advogados, dispõem de todo o tempo do mundo para se defenderem e, mesmo condenados, não perdem o mandato e ainda podem receber o benefício da liberdade se o prazo da condenação sair da validade (ou prescrição). Sem mencionar o período eleitoral que se aproxima.

E numa legislação penal tão contaminada, até mesmo juristas de respeito como o ministro Joaquim Barbosa acabam refém não só de colegas de má fé, como também da própria ferramenta que deveria ser sua maior aliada: a própria lei. Logo, enquanto não lutarmos pela mudança dessa vergonhosa legislação, nesse tabuleiro, os tribunais e juízes serão tão executores da lei quanto os pizzaiolos no fazer da boa pizza ao molho bolonhesa de sua cantina mais próxima.